Duas Visões – Privacidade?

O QUE O OBAMA QUER SABER?

Nas últimas semanas se tornou público o que todo mundo sabia: o governo estadunidense espiona e monitora milhões de pessoas, bisbilhotando as suas ligações e dados eletrônicos (e-mails, mensagens e conteúdos de redes sociais).

Aqui no Brasil temos assegurado na Constituição Federal como garantia fundamental o direito à privacidade e à intimidade.

Juridicamente todos têm o direito de não ser monitorados, de não ser registrados e de não ser reconhecidos; obviamente que há exceções.

No entanto, este relato de voyeurismo dos norte americanos pede algumas reflexões mais aprofundadas que não vamos conseguir esgotar.

Um dos lados é este de voyeurismo com ou sem o sentido estrito do termo. O que será que o Obama quer saber de nós?

Sei não, mas para mim isso está mais relacionado com briga de poder e muita grana do que com barbudos e fanáticos terroristas.

George Orwell em 1949 lançou o imprescindível livro 1984. Nele descreve o Big Brother como um personagem que zela por todos, em uma espécie de patrulhamento do pensamento.

Hoje é irônico ver que o livro foi classificado como ficção política e ficção de ciências sociais.

O personagem principal, inclusive, virou título de um reality show, que de realidade não tem nada.

Então vemos este paradoxo: o show da realidade que é falso pelos estereótipos que apresenta, e o livro de ficção política que é a realidade pela prática corriqueira. Explica Obama?

Mas este mundo de exposição e de exibicionismo não necessita de muita força para se perder a privacidade. Quando eu posto uma foto em uma rede social, a foto é de quem? Minha? Será mesmo?

E ainda fico na ilusão de que quando apago a foto ela de fato sumiu…

A entrega do direito é voluntária. Acabamos amando este Grande Irmão que nos vigia sempre e constantemente está zelando por você.

Mas fora estes debates filosóficos e psicológicos, há na verdade uma privacidade absoluta? Há direito de ficarmos ocultos neste mundo que pouco conhecemos?

Paulo de Tarso que sabia das coisas (sem bisbilhotar!) escreveu na sua Carta aos Hebreus (cap. 12, vv 1 e 2) que nós porque “estamos rodeados de uma tão grande nuvem de testemunhas, deixemos todo embaraço e o pecado que tão de perto nos rodeia e corramos, com paciência, a carreira que nos está proposta”.

Ou seja, não há nada de fato oculto. Temos testemunhas espirituais de todos os nosso atos, bons ou ruins, louváveis ou não.

Portanto, nosso problema maior não é o perfil curioso de quem quer que seja, mas a nossa grande incapacidade de termos autenticidade. De sermos os mesmos em todos os lugares, pois se ainda temos que esconder algo, é por que temos que usar máscaras e viver fugindo de quem realmente somos.

BIG BROTHER IS WATCHING YOU!

Elder Cardoso é advogado e escreve sobre direito e espiritualidade. Acesse > https://eldercardoso.com/

A OSTENTAÇÃO DA PRIVACIDADE

Quem critica o funk e seu segmento chamado ‘ostentação’ (que cultua a posse de várias mulheres e carros luxuosos) deveria fazer uma autoanálise.

Por que então tira fotos e se apresenta como um personagem, um artista nas redes sociais? Por que tem a necessidade de vestir a roupa de marca, que agasalha como qualquer outra mais barata, para se destacar por onde passa? A história de Edward Snowden, o norte-americano que revelou a espionagem em larga escala do governo do seu país em vários locais do mundo, vem nos mostrar que ostentamos tanto o individual que perder a privacidade é um presente, uma conquista comemorada. Divulgamos tanta informações na internet que não é surpresa o ocorrido.

‘Ser é ser percebido’. Geroge Berkeley (1685-1753) observa que uma coisa só existe na medida em que ela percebe ou é percebida.

Somos nós.

Se antes tirávamos uma foto em uma viagem de férias, a revelávamos e depois de um certo tempo mostrávamos a imagem para quem nos visitava numa tarde de domingo no sofá que reunia toda a família… agora a emoção afixada no bom e velho álbum de fotografias é substituída por uma avalanche instantânea de caras e sorrisos forçados de ostentação (sem visitas de domingo e encontro pessoal).

Inegável os benefícios da internet e a possibilidade comunicacional infinita, todavia cresceu a nossa necessidade de sermos percebidos. Vivemos em uma sociedade que possui mais lojas do que bibliotecas. Vivemos em uma sociedade que possui mais salões de beleza do que pessoas precisando de beleza estética.

Queremos ser quem não somos. E dessa forma, desculpe-me Berkeley, mas nunca seremos mesmo sendo constantemente percebidos.

A psicologia também dá seu palpite na questão. Cito Lev Vygotsky (1896-1934), para quem construímos nossa identidade pela relação com os outros: ‘todas as funções psicológicas superiores são formas internalizadas de relações sociais’.

O meio nos molda – e, de fato, temos que nos adaptar com a forma de vida da sociedade que pertencemos. Mas ela não pode corromper o sentido que queremos ter para a nossa existência. Influencia sempre existirá e só será aceita se quisermos. Até porque nunca seremos o que a sociedade quer, porque a sociedade são milhões que espera que você seja diferente em milhões de maneiras e sentidos. E sinto dizer que você foi, é e continuará sendo um só.

E que bom, porque um é inteiro. Vários, você se fragmenta.

No campo espiritual, interessante observar que as entidades que se apresentam de maneira mais humilde são os mais evoluídos trabalhadores. Todos possuem sua parcela de contribuição, todavia entidades com nomenclaturas extravagantes se mostram ainda com a necessidade da ostentação, de se mostrar para ser percebida.

Com todo o respeito ao funk, mas quem considera o estilo musical aquém da moral humana precisa compreender que estamos também no mesmo patamar, realizando ostentação midiática da nossa privacidade.

Só somos alguém se formos manchete?

DANIEL POLCARO é jornalista e administra o Defenestrando.

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